Lavoura Arcaica, de Raduan Nassar

Vencedor do Prêmio Camões no ano passado (2016), o escritor brasileiro Raduan Nassar, hoje com 81 anos de idade, é comparado pela crítica a grandes nomes da literatura brasileira, de Clarice a Guimarães. O motivo: a qualidade linguística e poética de sua narrativa.

Nascido em Pindorama (SP), Raduan Nassar estreou no meio literário em 1975, com a publicação de Lavoura Arcaica. Depois, em 1978, lançou Um Copo de Cólera, escrito em 1970. Menina a Caminho, sua terceira e até então última obra publicada, uma reunião de contos dos anos 1960 e 1970, foi lançada em 1997.


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Lavoura Arcaica, o primeiro romance de Raduan Nassar, traz a história de uma família de trabalhadores rurais, tradicionalmente cristã, que sobrevive pela figura autoritária do pai.

O enredo arcaico é narrado, em primeira pessoa, por André, um dos três filhos da família rural, que resolve abandonar a vida do interior e ir morar em outra cidade. Um modo de fugir da autoridade do pai, da sofrida rotina da lavoura e de uma delicada e dramática paixão.

“E quando acontece um dia de um sopro pestilento, vazando nossos limites tão bem vedados, chegar até as cercanias da moradia, insinuando-lhes sorrateiramente pelas frestas das nossas portas e janelas, alcançando um membro desprevenido da família, mão alguma em nossa casa há de fechar-se em punho contra o irmão acometido.”

A narrativa existe pelo encontro de André e Pedro, o irmão mais velho. É neste encontro que o personagem conta as suas razões para sair de casa, fala sobre sua relação com a rigidez paterna e admite sobre o seu amor proibido.

Convencido pelo irmão a voltar para casa, André retorna ao lar, mas a insatisfação daquele ente que sempre pareceu ser o avesso de sua linhagem, permanece nos diálogos familiares.

“Já de pé, e olhando para o chão, e sofrendo a densidade da sua presença diante de mim, senti num momento suas mãos benignas sobre minha cabeça, correndo meus cabelos até a nuca, descendo vagarosas pelos meus ombros, e logo seus braços poderosos me apertavam o peito contra o seu peito, me tomando depois o rosto entre suas palmas para me beijar a testa.”

Novelesco e altamente lírico, Lavoura Arcaica é uma pedra preciosa da linguagem literária. O enredo e a narrativa de Raduan Nassar entram em perfeita sintonia em uma obra que, em suas misteriosas artérias, é não apenas uma crítica social, mas também um jeito de tratar da busca insana pela satisfação de desejos comportamentais.

Afrontamento e saciação. Lavoura Arcaica é uma pincelada, aparentemente leve, mas obscuramente densa, de prazer poético.

“Desde minha fuga, era calando minha revolta (tinha contundência o meu silêncio! tinha textura a minha raiva!) que eu, a cada passo, me distanciava lá d fazenda, e se acaso distraído eu perguntasse “para onde estamos indo?” – não importava que eu erguesse os olhos, alcançasse paisagens muito novas, quem sabe menos ásperas, não importava que eu, caminhando, me conduzisse par regiões cada vez mais afastadas, pois haveria de ouvir claramente de meus anseios um juízo rígido, era um cascalho, um osso rigoroso, desprovido de qualquer dúvida: “estamos indo sempre para casa”.”