Monteiro Lobato Contos Completos

Monteiro Lobato Contos Completos 2De Taubaté, interior de São Paulo, Monteiro Lobato (1882 – 1948) faz parte da lista de escritores mais influentes da literatura brasileira. É popularmente conhecido por sua obra infantil de contexto educativo, mas essa linha de literatura infantil constitui metade de sua produção literária. A outra metade inclui artigos, crônicas, livros sobre o ferro e o petróleo e, principalmente, contos. Monteiro Lobato também foi um grandíssimo produtor de contos, todos eles reunidos nessa bela edição que é Monteiro Lobato Contos Completos.


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Contista, tradutor, ensaísta e editor, Monteiro Lobato formou-se em Direito e atuou como promotor público. Após receber a herança deixada pelo avô, tornou-se fazendeiro. E foi nesse novo estilo de vida que o escritor começou a publicar contos em jornais e revistas.

Dono de tremendo sucesso literário infantil, criador de personagens históricos como a boneca de pano Emília, as crianças Pedrinho e Narizinho, a Cuca, o Visconde de Sabugosa, o Saci Pererê, entre tantos outros marcos que constituíram o famoso Sítio do Picapau Amarelo, Monteiro Lobato deixou quatro obras de contos. E são esses quatro livros de contos que estão reunidos em Monteiro Lobato Contos Completos.

“Quem a essa hora penetrasse no oratório da fazenda notaria nas vermelhas rosas de papel de seda que enfeitavam o santo Antônio a ausência de várias pétalas, e aos pés da imagem uma velinha acesa. Na roça, o ruge e o casamento saem do mesmo oratório.” (O Comprador de Fazendas – Urupês)

O primeiro livro é Urupês, considerado por muitos sua obra prima como escritor. Publicado como obra em 1918, Urupês teve ótima repercussão e alcançou grande sucesso. Os contos nele contidos trazem à tona a figura do caipira, do caboclo, e inauguram na literatura brasileira o chamado regionalismo crítico, conhecido por ser mais realista do que o produzido anteriormente no Romantismo. É em Urupês também que Monteiro Lobato apresenta o Jeca Tatu, um de seus personagens mais conhecidos nessa metade de literatura adulta do escritor.

Em Urupês, destaco contos como “O Engraçado Arrependido”, “O Comprador de Fazendas” e o belíssimo “A Colcha de Retalhos”, um dos contos mais lindos que já li.

“Depois? Depois a gripe inclinou, a normalidade foi se restabelecendo e os dois filhos restantes voltaram à casa materna. Em que estado! O menino, semimorto, cadavérico, e a Inês (só ao vê-la chegar soube Isaura qual das duas morrera) e a Inês com uma tosse de tuberculosa. E ali ficaram, destroços de horrível naufrágio, aqueles três miseráveis molambos de vida, sob a assistência da negra enfermeira – a Fome. Continuaram a viver, sem saber como, por instinto – num desvario, numa alucinação…” (Fatia de Vida – O Macaco Que Se Fez Homem)

A segunda obra de contos dessa edição é Cidades Mortas, publicada em 1919. Nesse livro, o autor dá ênfase para a decadência do Vale da Paraíba, citando um cenário decorrente da abolição da escravatura. “A Vida em Oblivion” é um dos variados contos dessa obra.

Negrinha, de 1920, é o terceiro livro da coletânea. É considerado por muitos como o livro de contos com os melhores já escritos por Monteiro Lobato. Os personagens dos contos de Negrinha são um pouco mais urbanos, mas o grande trunfo de Negrinha é a emoção contida em cada conto.

“Negrinha”, o conto que dá nome ao livro, está em lista de vestibulares e é uma das coisas mais sensíveis, no sentido emocional da leitura, que um leitor de Monteiro Lobato pode vir a ler. “O Fisco (Conto de Natal)” e “Uma História de Mil Anos” também valem a leitura.

O último livro dessa compilação de contos do autor é O Macaco Que Se Fez Homem, de 1923.

“(…) quando grossas nuvens reunidas no céu entraram a desmanchar-se. Sinal certo de chuva. Para confirmá-lo, um vento brusco, raspante, veio quebrar o mormaço, vascolejando a terra como a preveni-la do iminente banho meteórico. Remoinhos de poeira sorviam folhas secas e gravetos, que lá torvelinhavam em espirais pelas alturas. (…) E os primeiros pingos vieram, escoteiros, pipocar no chão ressecado. (…) E as bategas vieram, furiosas, em cordas d’água a prumo, como devia ser no chuveiro bíblico do dilúvio universal.” (Os Negros – Negrinha)

Monteiro Lobato Contos Completos é uma grande obra para os admiradores do escritor brasileiro. Pelas mais de 600 páginas de uma edição muito bem trabalhada, produzida com imagens e fotografias originais da vida do autor, o leitor percorre a obra de Monteiro Lobato em um momento do Brasil dominado pela pobreza.

As descrições, os temas escolhidos, o tratamento com a linguagem e até a crítica social presente nas obras, destacam uma preciosidade da literatura brasileira que entra para a história com a qualidade devida. Assim como toda a sua obra infantil, os contos de Monteiro Lobato mostram a integridade que há em se ter para com ele o respeito que ele merece.

“Calou-se, a lacrimejar, trêmula.
Calei-me também, opresso dum infinito apertão de alma.
Que quadro imensamente triste, aquele fim de vida machucado pela mocidade louca!…
E ficamos ambos assim, imóveis, de olhos presos à colcha.
Ela por fim quebrou o silêncio.
– Ia ser o meu presente de noivado. Deus não quis. Será agora a minha mortalha. Já pedi que me enterrassem com ela.
E guardou-a dobradinha na caixa, envolta num suspiro arrancado ao imo do coração.
Um mês depois morria. Vim a saber que lhe não cumpriram a última vontade.
Que importa ao mundo a vontade última duma pobre velhinha da roça?
Pieguices…” (A Colcha de Retalhos – Urupês)