Precisamos falar: Man Booker Prize 2016

Precisamos falar Man Booker Prize 2016

Precisamos falar do Man Booker Prize 2016.

Foi anunciada nesta quarta-feira, 27, a lista de indicações ao Man Booker Prize 2016, um dos maiores prêmios da literatura inglesa, que reconhece, desde 1969, a melhor obra de ficção em inglês escrita por autores de qualquer nacionalidade.

A lista divulgada pela organização do prêmio inclui 13 autores. No próximo dia 13 de setembro serão conhecidos os seis finalistas. A premiação será entregue no dia 25 de outubro.

O grande destaque das indicações ao prêmio é o autor sul-africano J.M. Coetzee, selecionado para a final com sua obra The Schooldays of Jesus. Coetzee ganhou o Prêmio Nobel de Literatura em 2003 e é, até então, o único autor a ganhar duas vezes o Man Booker Prize – ele ganhou em 1983 com Vida e Época de Michael K., e em 1999 com Desonra, livro já resenhado aqui no Ser de Livros. (leia a resenha de Desonra)

Entre os favoritos, Coetzee pode ser o único autor a ganhar três vezes a respeitada premiação. Confira os finalistas e seus respectivos romances do Man Booker Prize 2016:

Paul Beatty (EUA) – “The Sellout”
J.M. Coetzee (África do Sul) – “The Schooldays of Jesus” 
A.L. Kennedy (Reino Unido) – “Serious Sweet” 
Deborah Levy (Reino Unido) – “Hot Milk” 
Graeme Macrae Burnet (Reino Unido) – “His Bloody Project”
Ian McGuire (Reino Unido) – “The North Water” 
David Means (EUA) – “Hystopia”
Wyl Menmuir (Reino Unido) – “The Many” 
Ottessa Moshfegh (EUA) – “Eileen” 
Virginia Reeves (EUA) – “Work Like Any Other”
Elizabeth Strout (EUA) – “My Name Is Lucy Barton” 
David Szalay (Canadá) – “All That Man Is” 
Madeleine Thien (Canadá) – “Do Not Say We Have Nothing”

Fim, de Fernanda Torres

Fim, de Fernanda Torres 2A primeira atuação de Fernanda Torres no palco foi em 1978, aos 13 anos, na peça Um Tango Argentino. Do teatro, foi para a televisão, em 1981, atuar nas telenovelas Baila Comigo e Brilhante. Em 1983, foi para o cinema, protagonizar Inocência. E assim foi. No meio tempo, entrou no humor de Os Normais e Tapas & Beijos. No teatro, cinema ou televisão, Fernanda Torres tornou-se admirada atriz.

Mais recentemente, a artista começou a atuar em outro ramo, na imprensa. Em 2013, foi, enfim, para a literatura. Com Fim, seu primeiro romance, Fernanda Torres surpreendeu e mostrou ser completa também no universo literário.


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Fim conta a história de um grupo de cinco amigos cariocas que rememoram os momentos marcantes de suas vidas. Vitórias, arrependimentos, manias, realizações pessoais, festas, casamentos e separações.

Álvaro é sozinho, não suporta a ex-mulher e vive em consultórios médicos. Sílvio é corrompido pelo universo do sexo e das drogas. Ribeiro, praiano e atlético, vive com os efeitos do Viagra. Neto é o careta, marido fiel. E Ciro é o Don Juan abatido por um câncer.

Os cinco amigos são diferentes em seus aspectos, mas todos estão no extremo da vida. Viveram no êxtase dos anos 1960 e sofrem hoje os excessos da vadiagem e dos costumes e valores revirados de cabeça para baixo.

“(…) A morte não existe. Nem o budista reencarnacionista acha que vai voltar igual ao que foi. Vou estar na planta, na baba da lagarta que devora a planta, na mosca que lambe a baba da lagarta que devora a planta. Estarei por ali. Foi de bom tamanho, eu estava cansado. A indiferença daqui me cai bem. (…) Uma vez, li que a morte era o momento mais significativo da vida, e é mesmo. A minha foi boa, está sendo, não por muito mais.”

A história é feita de humor e memórias, de amizades e desencontros, de sexo e loucuras, de praia e sol, de homens e mulheres, de vida e morte.

Vezes melancólica e complexa, vezes graciosa e sem amolações, a história da obra é muito bem trilhada para um romance de estreia. A narrativa, o modo de contar, é muito bem explorado. A história é muito bem contada. Grosso e sutil, o enredo é trágico e debochado ao falar do ser humano.

“Meu filho me arrastou para o hospital no dia em que eu apareci pelado na portaria perguntando por fogo. Eu queria acender um cigarro. Não esbocei reação, dei a mão para ele e me deixei levar. O Parkinson acaba com a iniciativa da gente. (…) Na clínica, me viraram de cima a baixo e deram o veredito: dali para frente, eu teria dificuldade para andar, falar, comer, pensar, dormir e trepar. Grande notícia. E ainda se paga para ouvir uma merda dessas.”

Fim é o descompasso do ponto de chegada, a tortura da corrida contra o tempo, a lembrança da ressaca decadente e a agonia da ilusão terminal. Fim fala do fim e fala da vida. Fim é um novo começo para Fernanda Torres. Um belo começo.

“(…) Estou vivendo a minha morte, pensou. Parou para assistir.”

A Balada de Adam Henry, de Ian McEwan

A Balada de Adam Henry, de Ian McEwan 2Dilemas podem ser encontrados em vários universos. Em A Balada de Adam Henry, Ian McEwan mescla dois desses universos onde dilemas são muito, mas muito frequentes: o jurídico e o religioso.

Ian McEwan está na lista dos escritores mais importantes de sua geração. Britânico, com quarenta anos de carreira, o autor, ganhador de diversos prêmios, já escreveu romances como Amor Sem Fim, Amsterdam e Reparação.

A Balada de Adam Henry complementa a obra do ficcionista com uma história baseada em um grande dilema que, por sua vez, resulta em outros dilemas.


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A personagem principal do livro é Fiona Maye, uma juíza do Tribunal Superior especialista em direito de família. A carreira da protagonista é de muito sucesso profissional, mas no quesito vida privada nem tudo corre às mil maravilhas.

Prestes a completar sessenta anos de idade e vendo seu casamento desmoronar, Fiona conduz o enredo contando-nos embates tanto de sua vida pessoal como profissional, onde enfrenta casos de grande complexidade moral.

“Naquele setor do Judiciário, não era comum mandar gente para a cadeia, mas, apesar disso, em certos momentos ela tinha vontade de ordenar que fossem encarcerados aqueles demandantes que, à custa dos filhos, desejavam uma mulher mais jovem, um marido mais rico ou menos enfadonho, um bairro mais elegante, novas aventuras sexuais, novos amores, uma nova visão do mundo, um bom reinício antes que fosse tarde demais. A simples busca do prazer. Vulgaridade moral.”

Na turbulência cotidiana da vida da juíza da Vara de Família, cai nas mãos de Fiona o caso de um garoto de dezessete anos chamado Adam Henry. Ele sofre de leucemia e, para sobreviver, depende urgentemente de uma transfusão de sangue. Os familiares do garoto, no entanto, são testemunhas de Jeová e não autorizam o procedimento.

“Deus lhe havia dado a vida, só ele podia acabar com ela.”

O hospital recorre ao Judiciário e torna-se responsabilidade de Fiona julgar o caso.

Adam ainda não completou dezoito anos e, influenciado ou não pelos pais e seus dogmas religiosos, assiste à grande decisão que lhe dá o destino de sua vida.

“Estavam convencidos de que ele sabia o que queria e, além de estar vivendo a verdade, se mostrava pronto a morrer por ela.”

O dilema, porém, vai além de decisão judicial. E neste ponto o leitor, em minha opinião, deve recorrer ao bom senso para ler a obra. O problema é que, repentinamente, estreita-se a relação de Fiona com Adam Henry. A mulher vai ao hospital conhecer o garoto e isso mexe com as duas partes.

Os sentimentos que Fiona desperta em Adam surpreendem a juíza e, em certo ponto, a incomodam. O menino compõe, então, uma balada para Fiona – daí o título do livro.

Fiona, que sempre abusou da racionalidade para organizar os casos que lhe cabe julgar, não consegue resolver seus próprios embates. A juíza, que sempre levou uma vida disciplinada, vê tudo desorganizar e cai no grande dilema.

O caso Adam Henry está em suas mãos. Um caso de vida ou morte, literalmente.

“Ela acreditava ser capaz de injetar razoabilidade em situações onde não havia mais esperança.”

É nesse ambiente jurídico, com entradas da vida privada de Fiona, que a personagem vive momentos de impasse com um caso que trata, querendo ou não, de crenças religiosas.

Em A Balada de Adam Henry, McEwan lida não só com dilemas e conflitos morais, mas também reflete sobre a intolerância religiosa que sobrevive na sociedade.

“Adam tratou de encontrá-la, querendo o que todo mundo quer, e que só pessoas de mente aberta, e não o sobrenatural, podiam dar: um sentido para a vida.”

3 livros de João Ubaldo Ribeiro

3 livros de João Ubaldo Ribeiro

João Ubaldo Ribeiro nasceu na Bahia em 1941. Formado em Direito, foi escritor, jornalista, roteirista, cronista e professor. Ocupou a cadeira 34 da Academia Brasileira de Letras e ganhou diversos prêmios, entre eles o Prêmio Camões de 2008. Algumas das obras de João Ubaldo Ribeiro foram adaptadas para o cinema e para a televisão.

O escritor faleceu no dia 18 de julho de 2014 no Rio de Janeiro. Além da vasta obra de crônicas cotidianas publicadas em jornais e revistas, João Ubaldo Ribeiro escreveu romances conhecidos sempre pela perspicácia sobre aspectos sociais e políticos da vida nordestina e brasileira.

Levando sempre em conta o contexto social do país, muitas vezes traçado com ironia, a obra de João Ubaldo Ribeiro figura e centraliza o povo brasileiro. Eis três livros do escritor baiano:

Sargento Getúlio

Publicado em 1971, a obra regionalista trata da criminalidade no sertão. Monólogo de base, a história é entrecortada por diálogos feitos pelo personagem Getúlio Santos Bezerra, um sargento da polícia militar de Sergipe. A obra foi base para o filme de mesmo nome lançado no ano de 1983.

Viva o Povo Brasileiro

Livro histórico da obra de João Ubaldo Ribeiro, de 1984, é uma narrativa com personagens fictícios. No entanto, é baseado em fatos reais da história do Brasil, desde a ocupação portuguesa até a Ditadura. Apesar do nome exaltar o povo, a história do livro conta, nas vozes de oprimidos, a trajetória do país de maneira crítica e satírica.

A Casa dos Budas Ditosos

Romance publicado em 1999, fez parte da série Plenos Pecados da Editora Objetiva. Tendo o pecado da luxúria como tema, o livro é narrado por um mulher, baiana, de 68 anos, que fala da própria vida. Vida de prazer, vivida sem culpa. Em 2004, foi adaptado para o teatro, monólogo encenado por Fernanda Torres.


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Preconceito Linguístico, de Marcos Bagno

Preconceito Linguístico, de Marcos Bagno 2Podando a roseira, sem preconceito ***

BAGNO, Marcos. Preconceito linguístico. São Paulo: Parábola Editorial, 56ª ed. revista e ampliada, 2015; 352 páginas.


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Natural de Cataguases, o mineiro Marcos Bagno, nascido em 1961, é linguista, escritor, tradutor, poeta, professor e doutor em filologia e língua portuguesa. Com maior atuação no estudo da sociolinguística e da educação linguística, Bagno compila uma lista de obras publicadas que percorre, além de análises no campo linguístico, contos, poesias, novelas e também literatura infanto-juvenil.

Como produto de seu exercício como pesquisador da língua, destaca-se, entre seus livros: A Língua de Eulália: novela sociolinguística (1997); Português ou brasileiro? Um convite à pesquisa (2001); A norma oculta: língua & poder na sociedade brasileira (2003); e Gramática de bolso do português brasileiro (2013), entre outros tantos.

Preconceito linguístico: o que é, como se faz (1999) é, no entanto, um grande destaque da obra do escritor. O livro desenvolve uma análise sobre o preconceito diante da língua e suas vertentes, desde posturas discriminatórias até a educação e as variações linguísticas.

Muito se fala em preconceito, mas pouco se debate sobre o preconceito linguístico especificamente. É nesse pilar que Bagno estende sua análise e discussão.

O autor introduz o tema levantando as mitologias do preconceito linguístico. No primeiro capítulo da obra, Bagno identifica, debate brevemente e faz rápidas conclusões a respeito de oito mitos que cercam a discriminação linguística. O grande diferencial do pesquisador, porém, é o fato de, sucintamente, mas de forma direta, ao levantar o mito, ele já rebater e apresentar dados capazes de desfazer o equívoco que existe em tal crença.

O primeiro deles sinaliza o mito de que o português brasileiro apresenta uma “unidade surpreendente”. Com isso, o autor já defende uma tese que irá transitar durante toda a obra. Bagno afirma que

“toda e qualquer língua humana viva é, intrinsecamente e inevitavelmente, heterogênea, ou seja, apresenta variação em todos os seus níveis estruturais […] e em todos os seus níveis de uso social […]”. (p. 27, grifo do autor)

Nessa construção – e desconstrução – Bagno afirma que existe, no Brasil, um forte “abismo linguístico” advindo das diferenças de status socioeconômicos entre os falantes das variedades chamadas estigmatizadas (habitantes da zona rural ou periferias, pobres e analfabetos ou semianalfabetos) e os falantes das variedades prestigiadas (moradores de centros urbanos, escolarizados e de maior poder aquisitivo).

Em debate direto com essa questão, que serve como base para todo o desenvolvimento da obra literária do autor, Bagno diz que todos os falantes do português brasileiro deveriam ter maior acesso a essa espécie de língua oficial.

Em processo com as outras mitologias apresentadas pelo escritor no primeiro capítulo, há ainda os mitos do preconceito linguístico que falam que “só em Portugal se fala bem português”, que a língua portuguesa é difícil, que “as pessoas sem instrução falam tudo errado”, que “o lugar onde melhor se fala português é no Maranhão”, que a forma certa de falar advém da forma certa de escrever, que “é preciso saber gramática para falar e escrever bem” e que a ascensão social se dá pelo domínio da norma-padrão.

Em resumo, nesta primeira parte do livro, o pesquisador revela e desfaz todos esses mitos. O que difere a pesquisa de Bagno, no entanto, é o levantamento de problemas que vão além do básico. Em Preconceito linguístico, Bagno critica as gramáticas, as normas, o ensino, a escola, os vestibulares e muitos outros caminhos capazes de chegar a uma mesma conclusão, que resume, em uma só frase, todo o campo do preconceito discutido por Bagno:

“[…] são simplesmente diferenças de uso – e diferença não é deficiência nem inferioridade”. (p. 51, grifo do autor)

Bagno sustenta a ideia de que o preconceito linguístico é decorrente de um preconceito social. E, firmemente, defende que há um fenômeno chamado “variação” e que nenhuma língua é falada igualmente por todos nem em todos os lugares. Além de discriminação ou supervalorização, o preconceito linguístico encerra-se sempre nesse mesmo patamar: o da variação.

Nos capítulos seguintes da obra, Bagno enfatiza essa análise ao atribuir termos como “comandos paragramaticais” e ao demonstrar o círculo vicioso que há no preconceito da língua, quando diz que a gramática tradicional inspira o ensino em prática que, por sua vez, suscita a indústria do livro didático que, para ser realizado, recorre à gramática tradicional.

Em dado momento, o autor, depois de construir e desconstruir práticas e teorias linguísticas, reconhece crises e ações que subvertem o preconceito linguístico. Nessa abordagem, Bagno propõe discussões sobre o ensino do português, sobre metalinguagem e epilinguagem, e também avalia o preconceito contra a linguística e os linguistas. O autor questiona e argumenta sobre o que é certo e o que é errado, sempre com demonstrações e exemplificações pertinentes, não abusando de abordagens teóricas.

Para Bagno,

“a língua é viva, dinâmica, está em constante movimento. […] É uma fênix que, de tempos em tempos, renasce das próprias cinzas. É uma roseira que, quanto mais a gente vai podando, flores mais bonitas vai dando.” (p. 168)

Bagno é muito direto em Preconceito linguístico. Por mais que haja descrições, às vezes amplas, e acréscimos de exemplos – altamente necessários para situar o leitor na discussão – a linguagem que o autor utiliza para falar do tema é simples e vantajosa, pois faz com que os capítulos transcorram de forma organizada.

O autor reúne os destaques e as críticas que bem lhe cabem para o assunto. Ele apresenta propostas e debates e discorre opiniões. Bagno, em certos momentos, instiga o leitor a ter uma opinião sólida sobre o tema, assim como ele, que tem uma posição clara e criteriosa e nos mostra isso.

Preconceito linguístico pode ser considerada uma leitura obrigatória não só para os pesquisadores e estudiosos da área, mas também aos interessados no assunto, que queiram saber mais sobre esse tipo de preconceito pouco discutido, mas que carrega grande reflexão, por vezes indispensável.

Bagno mostra que é preciso falar de preconceito linguístico e contribui fortemente com essa incursão que as páginas do livro retêm. Preconceito linguístico merece ser lido não para bisar tal discussão, mas para introduzir um tema essencial que envolve um dos maiores e mais relevantes elementos do ser humano: a língua. E nem com ela deve haver preconceito.


*** Essa resenha foge ao modelo habitual do site por um devido motivo. Ela não foi produzida especialmente para o Ser de Livros, diferente das outras resenhas que aqui publico. Resenhei o livro Preconceito Linguístico para a faculdade, mais especificamente para a disciplina de Teoria Linguística. Portanto, essa resenha que vos apresento está mais voltada à norma culta da língua portuguesa e às modalidades padrões do gênero acadêmico.