Ciranda de Pedra, de Lygia Fagundes Telles

Ciranda de Pedra, de Lygia Fagundes Telles 2Aos quase 93 anos de vida, a escritora Lygia Fagundes Telles foi indicada ao Prêmio Nobel de Literatura 2016. E nada melhor do que, para a primeira leitura da autora brasileira, o primeiro romance escrito por ela: Ciranda de Pedra.

Publicado em 1954, Ciranda de Pedra já foi utilizado como base para duas telenovelas homônimas da Rede Globo, em 1981 e em 2008.


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A obra é dividida em duas partes. Na primeira, o leitor acompanha a vida de Virgínia quando ainda é menina, criança. Caçula de três irmãs, Virgínia sofre o baque da separação dos pais. Mas só ela que vai morar com a mãe, Laura, e o padrasto, Daniel, enquanto as irmãs, Bruna e Otávia, ficam com o pai, Natércio.

Na primeira parte do livro, a visão de Virgínia assiste à crise que desestrutura a família burguesa altamente polida. A menina, confusa, tenta se adaptar a uma vida acompanhada da loucura da mãe, do rancor do pai, do desespero do padrasto, da hostilidade das irmãs e do amor platônico por um garoto.

Pela visão ingênua de Virgínia, conhecemos seus sonhos, suas imaginações, seus pensamentos, seus desejos, seus medos e, principalmente, seus sentimentos.

“- (…) Virgínia, você fez agora um gesto que fazia quando era pequenina assim… Quando qualquer pessoa se despedia e ia embora, você ficava olhando para o lado por onde a pessoa tinha desaparecido, abria os braços e repetia, ah!… cabou!… cabou!… Então dava uma certa tristeza porque a gente ficava com a impressão de que a pessoa não voltaria nunca mais, que estava mesmo tudo acabado, acabou-se! Pois é, acabou-se.”

A catástrofe familiar de Ciranda de Pedra aumenta e o leitor chega à segunda parte da obra. Depois de vários anos, interna num colégio de freiras, Virgínia volta ao convívio da família já jovem adulta. Com outros olhos, a garota vê as transformações de todos e dela mesma.

Virgínia vê que as aparências enganam e que ninguém é realmente o que parece ser.

“Com um gesto lento, Virgínia amarfanhou entre os dedos uma folha seca que o vento atirara para dentro do carro. Sentiu as mãos geladas embora a tarde estivesse quente. “É a volta”, justificou para si mesma. “Depois de tanto tempo, por maior que seja o desligamento, a gente sempre se impressiona um pouco”, concedeu. Mas sentia-se vagamente decepcionada. A verdade é que se julgara muito mais invulnerável àquela mistura de emoções que lhe davam obscuramente uma sensação de insegurança.”

Quando volta à família, certas coisas permanecem iguais, mas outras não. Com o tempo, todos podem mudar. Ninguém sabe tudo de ninguém e ninguém sabe nada de ninguém.

O que na primeira parte da obra era focado na família e no sofrimento de Virgínia, a segunda parte é possuída pelo amor. O drama da família vira a delação do romance. A roda das relações gira. Há mudanças, caminhos se cruzam. Os amores chegam até certo ponto inesperado ao leitor. É a normalidade nem tão normal assim. São as aparências…

Nessa gira, porém, a vida de Virgínia carrega marcas eternas que a obrigam a conviver da melhor, ou pior, maneira possível.

“- (…) Ouça, Virgínia, é preciso amar o inútil. Criar pombos sem pensar em comê-los, plantar roseiras sem pensar em colher as rosas, escrever sem pensar em publicar, fazer coisas assim, sem esperar nada em troca. A distância mais curta entre dois pontos pode ser a linha reta, mas é nos caminhos curvos que se encontram as melhores coisas.”

Um dos sonhos da menina Virgínia nunca mudou. Ela sempre quis entrar na roda. Solitária, sempre desejou isso. Ela mal sabia que quando entrasse, nem tudo seria como imaginava ser.

O marco inicial de Lygia Fagundes Telles é caracterizado pela sensibilidade da autora para com os sentimentos dos personagens. Em Ciranda de Pedra, Lygia explora as características psicológicas dos personagens de ótima maneira.

Ciranda de Pedra é muito bem descrito já no texto da contracapa: “Nessa ciranda de sentimentos, cada um guarda seus segredos, anseios e frustrações (…)”. Uma roda de sensações, uma gira de sentimentos… É a ciranda da vida.

“(…) O tempo incumbira-se de suavizar-lhe os traços e agora ali estava refletida no espelho a delicada imagem de uma moça sorrindo de si mesma na tentativa de reconstituir a antiga expressão da meninice. Onde se escondera o rostinho anguloso, agressivo?

– Libertei-me.”

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