50 Contos de Machado de Assis

Romances, peças teatrais, poesias, sonetos e crônicas. Machado de Assis, considerado um dos maiores autores brasileiros de todos os tempos, também escreveu muitos contos. Fala-se, aproximadamente, em duzentos, no total.

Um quarto dessa parte de obra está no livro 50 Contos de Machado de Assis.

Os 50 contos foram selecionados por John Gledson, tradutor, ensaísta e crítico literário britânico que se especializou em língua portuguesa e em literatura brasileira, principalmente nas obras de Machado de Assis.


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Machado é um mestre literário. Mesmo assim, muita gente não aprecia sua obra. O que acontece é: os livros de Machado de Assis talvez sejam apresentados a nós de uma forma incorreta. Pois grande parte da obra desse escritor é solicitada em vestibulares e os jovens acabam lendo por aquela “obrigação” – se é que podemos chamá-la assim. Há muito mais na obra de Machado de Assis!

Além dos famosos romances, os contos do autor brasileiro nascido no Rio de Janeiro também estão aí para serem (corretamente) apreciados. Ler os contos de Machado de Assis é outra forma de conhecer o requinte do escritor.

Reunidos cronologicamente, os textos compilados na obra 50 Contos de Machado de Assis foram escritos entre 1839 e 1908 e publicados originalmente em jornais e revistas da época entre 1878 e 1906. Posteriormente, todos os contos de Machado foram sendo publicados em diversas coletâneas lançadas ao longo dos anos.

Tratando dos 50 reunidos na edição da Companhia das Letras, e comparando-os, todas as histórias são diferentes, é claro. No entanto, alterando o estilo ou a temática do texto, todos os contos de Machado de Assis contêm a marca registrada do escritor: a ironia.

Os contos de Machado são marcados pela ironia, pelo subentendido. Entrelaçadas com um humor inteligente, as histórias fazem o que Machado sabia fazer muito bem, que é ridicularizar sutilmente. Machado criticava quem queria criticar e nunca foi censurado. Isso porque a literatura do autor, muito bem representada nesta coletânea de contos, era elegante e bem escrita.

“O Machete”, “D. Benedita”, “O Alienista”, “A Chinela Turca”, “Missa do Galo”. São muitos os bons contos de Machado de Assis. Os enredos vão do homem que se olha no espelho e vê que seu reflexo desapareceu até um jovem fissurado nos braços de uma mulher mais velha. As histórias dos contos de Machado falam sobre um rapaz que se satisfaz em torturar ratos e encara a morte da esposa com o mesmo prazer; ou sobre uma ex-prostituta apaixonada por um homem que o trai com um desconhecido; ou ainda sobre uma mulher que esconde a idade e por isso impede o casamento da filha. Posso ainda citar o violoncelista que cria uma forte relação com o cavaquinho, levantando um duelo entre o erudito e o popular; ou o médico que decide estudar sobre a loucura, abre uma casa que serve como uma espécie de manicômio e, por crer num tratamento, acredita na cura da loucura. Tudo isso além dos três capítulos inéditos do Gênesis, em que os filhos de Noé, na arca, disputam pela terra pós-dilúvio.

Na obra literária de Machado de Assis, nada é como parece ser. Nesta coletânea, o humor passeia pela provocação e cai no constrangimento. 50 Contos de Machado de Assis é um contêiner de ironia e, por ser assim, nos faz pensar. E esta é uma das melhores formas de literatura.

Memórias Póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis

Memórias Póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis 2Joaquim Maria Machado de Assis, carioca de 1839. Em seus quase 70 anos de vida, consagrou-se como romancista, cronista, contista, folhetinista, poeta, dramaturgo, jornalista e crítico literário. O escritor foi e é até hoje por muitos considerado o maior autor da literatura brasileira e um dos grandes nomes da literatura mundial.

De família pobre e estudos precários, Machado de Assis assumiu cargos públicos pela intelectualidade natural. Publicou seus primeiros textos em jornais até fundar a Academia Brasileira de Letras. Em números: nove romances e peças teatrais, cinco compilações de poemas, duzentos contos e mais de seiscentas crônicas. Em foco, nesta resenha: Memórias Póstumas de Brás Cubas, obra que deu ao Machado de Assis o posto de introdutor do Realismo no Brasil.


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O menor dos spoilers, o mais óbvio fato: Brás Cubas está morto. É ele o narrador da história e, como diz o título, são essas as suas memórias póstumas. Pois é depois de morto que o personagem resolve nos contar sua vida.

Na narrativa póstuma de sua trajetória, Brás Cubas discorre e opina sobre as questões que quer discutir e faz isso sem receio de julgamentos alheios. Da infância até a juventude, depois até o fim de sua existência, o personagem fala sobre sua vida nos mais diversos aspectos e com as mais devidas lembranças. Quincas Borba, Prudêncio, Dona Eusébia, Eugênia, Marcela, Virgília, Lobo Neves, Cotrim, Nhã-Loló. São muitos os personagens que marcaram a vida de Brás Cubas.

Relacionamentos e envolvimentos, carreira política e ação beneficente. Tudo pano de fundo para uma história que é, em essência, melancólica. O fim de Brás Cubas é inevitável e conhecido.

“A razão não podia ser outra senão o momento oportuno. Não era oportuno o primeiro momento, porque, se nenhum de nós estava verde para o amor, ambos o estávamos para o nosso amor: distinção fundamental. Não há amor possível sem a oportunidade dos sujeitos.”

Produzido inicialmente como folhetim, Memórias Póstumas de Brás Cubas foi publicado como livro em 1881. Marcando um novo estilo de Machado de Assis, a obra é inovadora para a literatura nacional não só pela temática, mas também pela narrativa que deixa de ser linear para tratar de um cenário da maneira mais pessimista e indiferente possível, dando início, assim, ao chamado Realismo brasileiro.

Com entradas para a escravidão e para a luta de classes sociais, o livro também tenta criar uma nova filosofia, o Humanitismo, uma lei (satírica) melhor desenvolvida posteriormente no romance Quincas Borba, de 1891.

Memórias Póstumas de Brás Cubas é considerada uma das obras mais revolucionárias da literatura nacional, sendo chamada até de primeira narrativa fantástica do Brasil.

“Saí, afastando-me dos grupos, e fingindo ler os epitáfios. E, aliás, gosto dos epitáfios; eles são, entre a gente civilizada, uma expressão daquele pio e secreto egoísmo que induz o homem a arrancar à morte um farrapo ao menos da sombra que passou. Daí vem, talvez, a tristeza inconsolável dos que sabem os seus mortos na vala comum; parece-lhes que a podridão anônima os alcança a eles mesmos.”

O defunto mais falado da literatura brasileira, Brás Cubas, defunto-autor, não autor defunto, como o próprio faz questão de afirmar, não quer ser um grande escritor morto e sim um morto capaz de escrever.

Para ler essas memórias póstumas, há de se entender isso e não rebater tal questão. Brás Cubas, afinal, é obra de Machado de Assis, um gênio da literatura e também, é claro, da ironia. Afinal, Brás Cubas se ausenta de culpabilidades ao encerrar suas memórias dizendo que não teve filhos para não transmitir “a nenhuma criatura o legado da nossa miséria”.

“Agora, quero morrer tranquilamente, metodicamente, ouvindo os soluços das damas, as falas baixas dos homens, a chuva que tamborila nas folhas de tinhorão da chácara, e o som estrídulo de uma navalha que um amolador está afiando lá fora, à porta de um correeiro. Juro-lhes que essa orquestra da morte foi muito menos triste do que podia parecer. De certo ponto em diante chegou a ser deliciosa. A vida estrebuchava-me no peito, com uns ímpetos de vaga marinha, esvaía-se-me a consciência, eu descia à imobilidade física e moral, e o corpo fazia-se-me planta, e pedra e lodo, e coisa nenhuma.”