Caderno de um Ausente, de João Anzanello Carrascoza

Caderno de um Ausente, de João Anzanello Carrascoza 2Aviso importante: estou escrevendo este texto sem saber como.

Quando li Aos 7 e aos 40, do João Anzanello Carrascoza, e resenhei ele aqui, eu disse que “tocante” era a melhor palavra capaz de definir aquela obra.

Agora inventei de ler o outro romance desse autor, Caderno de um Ausente.

Acho que nunca um livro mexeu tanto comigo assim…


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Escrevo este texto sem saber como, pois ainda estou paralisado. Acabei de terminar a leitura de Caderno de um Ausente e não estou sabendo lidar.

É verdade. Terminei o livro com água nos olhos e um grito externo de palavrão.

“e esse é um método que aprendi ainda menino, desenhar com a imaginação o retrato das pessoas queridas e ausentes, porque nada é capaz de reacender alguém em nós mais rapidamente do que a vida experimentada à mesma hora;”

O sentimento de Caderno de um Ausente fica cravado no leitor até muito depois do fim da leitura.

“porque, às vezes, há mais seca numa inundação do que num deserto, mais verão numa folha do que num bosque inteiro;”

Caderno de um Ausente é um caderno escrito por um pai à filha recém-nascida. Com a certeza de que passarão pouco tempo juntos, o pai escreve tal diário para suprir e tentar fazê-la compreender a possível ausência na vida da menina.

“Mas tu, não. Vens com esta marca, de minha ausência, a envolver inteiramente a tua vida, e este é um dos primeiros sustos que temos nesta existência, somos o que somos, não há como alterar a nossa história, sobretudo se ela já começa no meio, ou mais próxima do fim”

Voltando ao passado e idealizando um futuro verossímil, o pai, pelo caderno, desabafa certezas sem evidências, concretiza dúvidas repletas de possibilidades ocultas.

“a tua vida, filha, é um texto que há tempos começamos a escrever, mas, daqui em diante, também te cabe pegar esta tinta e delinear o teu curso, tome só cuidado com o que retiras do nada e trazes à superfície, é comum borrar ou rasurar um trecho, mas é impossível apagá-lo”

A narrativa de Caderno de um Ausente é melancólica. Corrida, discretamente entristecida, um desalento de pesares.

Caderno de um Ausente não é uma história. É um caderno de reflexões.

“pisar no meu silêncio é o teu primeiro passo pra me conhecer”

Através do caderno, o pai de meia-idade conversa com a filha com uma prosa poética extremamente sensível. Caderno de um Ausente é, assim como Aos 7 e aos 40, sensível e tocante. É forte, no sentido emocional do contexto.

“eu ia te contar o segredo do universo como quem sussurra uma canção de ninar, mas eu não posso, filha, eu só posso te garantir, agora que chegaste, a certeza da despedida.”

Carrascoza tem um poder de tocar o sentimental das pessoas que é impressionante.

Como o livro anterior, o projeto gráfico de Caderno de um Ausente também é diferencial.

A obra é composta de emoções – sem mais.

“A fome maior, Bia, a gente mata comendo os próprios lábios, mastigando com a gengiva os nossos dentes e engolindo a nossa própria garganta.”

Caderno de um Ausente é um livro silencioso. Não dá para lê-lo rápido, com pressa, em voz alta. É um livro que deve ser lido em silêncio. Demanda atenção e demanda presença.

Caderno de um Ausente discorre sobre silêncio e ausência.

“a mudez guarda em suas funduras o mundo inteiro”

Caderno de um Ausente é um livro cheio de ausência. E de tanta ausência, é um livro cheio de presença. Uma presença que nos faz sentir uma ausência interna que mexe com o sentimento de qualquer um.

O desfecho de Caderno de um Ausente corta um silêncio há muito existente.

Ainda não estou sabendo lidar…

“é isso que somos neste quarto, filha, um quadro onde a vida, aparentemente estática, se esbate senão com desespero, com a fúria de ser o que ela é – rosa que, a um só tempo, brota e se deteriora –;”

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